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Cinco de agosto – relato do meu parto na Suécia

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Cinco de agosto – relato do meu parto na Suécia

Nunca pensei que iria abrir meu coração de tal forma para falar sobre esse momento tão íntimo da minha vida. Mas acredito que o relato dessa experiência possa ser útil para você que está grávida ou pretende ter filho na Suécia.

Esse texto não terá fotos porque infelizmente minha gravidez não foi nada digna de editorial de revista. A realidade foi bem diferente…

Antes de falar do parto em si vou fazer um resumo dos meses da minha gestação, pois foi essa preparação que levou ao tipo de parto que eu escolhi no final das contas.

Relato do meu parto na Suécia

O primeiro filho traz muitas dúvidas e medos para a vida de uma mulher, e essas incertezas tomam proporções ainda maiores quando moramos “longe de casa”. Por isso é importante saber como “as coisas funcionam” no país onde moramos.

Na Suécia, o pré-natal é gratuito e feito no centro de saúde. Durante esse período temos o acompanhamento de uma enfermeira obstétrica. Aqui só vamos ter consulta com o médico propriamente se tivermos alguma complicação na gravidez.

O que faz todo sentido, já que gravidez em si não é doença, não é mesmo? As enfermeiras são preparadas para dar todo suporte necessário no pré-natal, até mesmo encaminhar para o médico se for necessário. Mas não são médicas.

Eu descobri que estava grávida bem no início da gestação, com apenas 3 semanas. Isso porque tive enjoos logo no início e assim foi até o 4º mês de gravidez. Comecei o meu acompanhamento no centro de saúde com a enfermeira (barnmorska em sueco) e depois fui encaminhada para a médica quando os enjoos pararam e deram lugar a uma terrível dor na região pélvica.

Nesse período descobrimos que eu tinha disfunção da sínfise púbica (foglossning), nome complicado que resumindo é uma dor pélvica muito comum na gravidez. Essa dor surge devido à pressão exercida pelo peso do bebê e ao desalinhamento e relaxamento das articulações da bacia. Geralmente a dor pélvica acontece no último trimestre de gestação, mas no meu caso começou no início do segundo, e as dores foram apenas complicando durante os meses. Ao ponto de eu andar de muletas e na maioria das vezes nem poder caminhar.

Além das dores em si, fiquei muito triste nesse período, principalmente porque por conta dessa disfunção eu tinha mais de 70% de chance de ser encaminhada para um parto cesário e eu não queria isso. Não era uma questão de orgulho ou para provar nada para ninguém, mas porque mesmo antes de pensar em ter filhos eu acreditava que o parto normal é a maneira mais natural de trazer um filho ao mundo. Além disso é o parto que tem mais vantagens para a saúde da mãe e do bebê.

Mas o fato é que eu passei meses com intensas dores na costas, que duram até hoje para falar a verdade, e eu passei minha gravidez praticamente toda fechada em casa.

Finalmente chegou o dia previsto para o nascimento da minha filha e nada aconteceu. Passou uma semana e nada. Eu tinha mais uma consulta marcada com minha enfermeira, uma consulta que fica agendada caso a criança não tenha nascido na data prevista.

Cheguei ao centro de saúde  nessa consulta extra e ao me ver a reação da enfermeira foi: “eu não esperava te ver aqui hoje”. Minha resposta foi o choro. Eu não aguentava mais estar grávida, morrendo de dores, sem poder sair de casa. Passei a consulta inteira chorando. Eu não queria nem ouvir quais eram os passos a seguir.

Na Suécia, em uma gravidez normal, esperariam até a semana 42 para só então fazer alguma intervenção que pode ser a indução do parto ou a cesárea. Depende de cada caso. Eu não estava preparada fisicamente nem psicologicamente para esperar mais mas também não queria “apelar” para a cesárea.

Nesses 15 dias que faltavam até a semana 42, o plano era: ultrassom para conferir se estava tudo bem com o bebê, mais uma consulta com a doula e por fim o encaminhamento para o hospital quando o “prazo” terminasse. Mas eu não aguentava mais. Então a doula atendeu meu pedido e ligou para o hospital para pedir uma intervenção.

Foi aí o início do meu parto humanizado. Parto que só tem intervenção médica quando for necessário para a saúde da mãe e do bebê e que respeita a vontade da grávida. E eu disse desde o início que só faria a cesárea em último caso.

Assim marcaram minha primeira visita ao hospital durante toda a gravidez. Era uma sexta-feira. Nessa consulta verificaram os batimentos cardíacos do bebê, fizeram o exame de toque e marcaram o dia para a indução do meu parto, que seria na segunda-feira seguinte. A esperança era de que as contrações começassem naturalmente durante o fim de semana.

Mas nada aconteceu…
Dia 4 de agosto de 2014, segunda-feria, cheguei ao hospital as 10horas da manhã. Nesse dia eu estava feliz da vida. Finalmente eu iria ver a minha filha e parar de sofrer de dores nas costas. Ah! Minha mãe também tinha chegado do Brasil e passaria um mês comigo. O que me deixou mais tranquila. 😀

Ao chegar ao hospital  a grande surpresa foi que, apesar de não ter sentido nenhuma contração no fim de semana, eu estava com 4cm de dilatação. O que também não quis dizer nada. Pois da hora que cheguei ao hospital até o nascimento da Nicole em si, passarem-se 23horas.

Fui encaminhada para o quarto onde eu ficaria até chegar o momento de ser levada para a sala de parto. Nesse quarto as enfermeiras/doulas faziam o monitoramento dos batimentos cardíacos da Nicole e também me davam o medicamente que induziria o parto.

Tomei a primeira dose do remédio. Horas se passaram e nada de contrações. Depois de outra dose… Nada de contrações ou dilatação.

Eu conversava com minha família e amigos no Whatsapp e brincava. “Tirando a velha dor nas costas nenhuma novidade. Esse forninho está tão bom que minha filha não quer saber de sair de dele”. Haha Era a piada do desespero.

Mais de 10 horas se passaram desde que dei entrada no hospital até que as 21:30 o bicho pegou. Comecei a sentir toda a dor das contrações de uma só vez.

Vale lembrar que na Suécia os pedidos da parturiente são atentidos e se algo não estiver de acordo com o que você espera eles devem fazer o possível para atender suas vontades. Outra coisa importante: o parto não será feito pela enfermeira que acompanhou seu pré-natal, e muito provavelmente a equipe vai mudar de turno se o seu parto for bem demorado, como foi o meu caso. Não é como no Brasil que geralmente o parto é feito pela médica(o) que fez o pré-natal.

Para mim isso não foi nenhum problema. Todas as doulas/enfermeiras que passaram por mim foram super atenciosas e gentis. Exceto uma delas, que na verdade nem foi rude, mas agia de uma forma mais fria, diferente das outras que foram carinhosas o tempo todo. Eu não gostei e nessa hora já estava dominada pelos hormônios e pela dor. Então eu me tranquei no banheiro e pedi ao Daniel que resolvesse o caso.

Ele gentilmente conversou com outra enfermeira da equipe que, sem questionar os motivos pediu para que a pessoa em questão saísse do meu quarto. E eu não tive mais nada do que reclamar.

Quero dizer… Exceto a demora para chegar finalmente a ser anestesiada.
Sim, porque na hora que a dor ficou realmente insuportável eu pedi a epidural. Eu queria parto normal mas nunca fui contra anestesia. Acho importante dizer que mesmo sendo a favor do parto normal devemos respeitar nossos limites. Minha dor nas costas junto com as contrações eram insuportáveis. Então, mesmo sabendo que a anestesia leva a um atraso no processo natural do parto eu quis ser anestesiada.

Só que a equipe da anestesia levou quase duas horas para chegar ao meu quarto, porque justo nesse dia o hospital estava com super-lotação de partos e acidentes. Nessa longa espera eu tive que me contentar com o tal “launghing gas”, o gás feliz, utilizado para aliviar as dores das contrações.

Eu fiquei tão desorientada com a dor e com o efeito desse gás, que ria descontroladamente. Tanto que o Daniel me perguntou: “tá doendo ou você está se divertindo”? E filmou a cena, claro. rs
Bom, quando a anestesista finalmente chegou eu me mexia tanto que a primeira tentativa de aplicar a anestesia falhou.

Ela perguntou: você quer que eu tente de novo? Obvio que sim, eu disse. Imagina! Aquela agulha não era nada perto das contrações. Logo a epidural funcionou  como um passe de mágica e eu virei um ser humano novamente. rs

E assim passamos a madrugada. Doses de anestesia, “gás feliz”, ginástica na bola de pilates, exercícios de respiração. Tudo isso em meio a uma mistura de sentimentos: emoção, medo, dor, ansiedade.

Até que chegou a enfermeira com a notícia esperada. “Está na hora”! A partir dali foram 40 minutos do processo de respira, faz força, empurra e faz tudo isso outra vez…

As 09:05 da manhã, do dia cinco de agosto de 2014, vi pela primeira vez a carinha da minha filha. E é realmente inexplicável a sensação de carregar um filho nos braços pela primeira vez. O mundo para. A dor desaparece. Parece que entramos em outra dimensão. Um momento muito mágico!

*****

O êxtase durou pouco tempo, pois tive uma complicação logo a seguir ao parto e fui encaminhada para uma sala de cirurgia. Nessa hora eu tive muito medo, sabe? Fui separada da Nicole apenas 6 minutos depois do seu nascimento. Mas eu senti que se algo acontecesse comigo eu tinha cumprido essa missão. Minha filha era perfeita e saudável e tinha um pai cuidadoso e minha mãe estava ali para apoiar no que fosse preciso.

Mas graças ao profissionalismo da equipe que cuidou do meu parto e pós-parto, poucas horas depois estávamos juntas novamente e eu já caminhava, quase sem dores nas costas com minha filha nos braços. <3

Hoje tenho a certeza de que tomei todas as decisões corretas. Ficamos bem e saudáveis e voltamos para casa 3 dias depois. Tive todos os meus desejos respeitados, fui bem acolhida e vou ser sempre uma defensora do parto humanizado.

Resolvi relatar minha história depois de tanto tempo para mostrar que não existe uma verdade absoluta, não existe um parto igual ao outro e nenhuma experiência será igual a outra. Mas acho que devemos nos informar, questionar imposições e nunca pensar que nossas dúvidas de mãe de primeira viagem são “coisas bobas”.

A blogueira Lu Ferreira, do blog Chata de Galocha, relatou sua mudança de médico quando descobriu a alta taxa de partos cesáreos feitos pela médica dela, na época já com 24 semanas de gravidez. Vale a pena ler a história dela aqui e também se informar sobre seus direitos.

Se você gostou desse tema e gostaria que eu falasse mais sobre ser mãe na Suécia deixe suas perguntas e sugestões aqui nos comentários. Vou adorar!

Acompanhe minhas aventuras de viagens com a Nicole e a vida na Suécia pelo Instagram @viajarpelaeuropa

E muito obrigada por ter acompanhado nossa história até aqui. 🙂

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